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Sra. Presidente

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O que pensa Ellen Gracie, a juíza que será a primeira mulher a assumir a
Presidência da República no Brasil e poderá solucionar causas bilionárias

Por hugo studart

Uma senhora discreta, austera e sobretudo organizada será a primeira mulher a assumir a Presidência da República no Brasil. Ela é Ellen Gracie Northfleet e, aos 57 anos, acaba de ser ungida presidente do Supremo Tribunal Federal – na quarta-feira 15, Ellen Gracie foi eleita para um mandato de dois anos com os votos de oito de seus pares. Como 2006 será ano de eleições gerais, tanto o vice-presidente José Alencar como os chefes da Câmara e do Senado, Aldo Rebelo e Renan Calheiros, estarão em campanha e impedidos de assumir a Presidência. Isso significa que, a partir de abril, toda vez que o presidente Lula viajar para o exterior essa senhora estará no comando do Palácio do Planalto – ainda que interinamente. Só por isso Ellen Gracie já teria um lugar reservado na história. Mas também estarão sob sua responsabilidade a análise de pendências entre empresas e instituições públicas, que ultrapassam R$ 100 bilhões, tramitando no Judiciário. Enfim, com tanto poder, Ellen Gracie chegou lá e tem tudo ocupar o imaginário popular, em especial das mulheres. “Prefiro ser tratada por presidente, não por presidenta”, vai logo avisando. “Presidente é mais leve”.

Sua passagem pelo comando do Supremo promete trazer novidades. Na década de 90, quando Ellen Gracie esteve no comando da Justiça Federal da 4ª Região, nos estados do Sul do País, ela foi responsável por um amplo processo de modernização e informatização dos tribunais. No STF, uma de suas prioridades será agilizar o julgamento dos processos – há casos em que um pedido de vistas por um ministro engaveta uma decisão por mais de dois anos. Na era Ellen Gracie, isso deve acabar. “Ela é uma Caxias”, brinca Nélson Jobim, atual presidente do Supremo. “Sua maior qualidade é ser ponderada”, acrescenta o ministro Gilmar Ferreira Mendes, seu colega de toga. Há hoje mais de 100 mil processos aguardando julgamento no Supremo. Só em janeiro último, chegaram 11,7 mil casos. Muitos deles são relevantes para a política e a economia. Nos próximos dias, por exemplo, o STF irá clarear as regras do jogo eleitoral, definindo se haverá ou não a verticalização das alianças. O tribunal também decidirá se os bancos são obrigados a aplicar o Código de Defesa do Consumidor, onde está escrito que a taxa de juros será no máximo de 12%. Em ambos os casos, Ellen Gracie não revelou sua posição. Ela é só um voto – dentre 11 pares. Mas cabe ao presidente da corte colocar o assunto em pauta.

Ellen Gracie herda de Jobim a administração de uma série de causas de grande impacto econômico, como o pedido de quebra do monopólio dos Correios, ou saber se o ICMS pode (ou não) fazer parte da base de cálculo da Cofins – além de duas dezenas de ações sobre fundos constitucionais, nas quais, se o governo perder, poderão surgir esqueletos que somam mais de R$ 30 bilhões. Um dos casos, prestes a entrar em pauta, definirá se os beneficiários do INSS têm direito retroativo a pensão integral em caso de morte do cônjuge – isso tem impacto de R$ 7 bilhões para o Erário. “Nós, mulheres, somos mais detalhistas”, diz ela. Nascida no Rio, filha única de um oficial da Aeronáutica, Ellen Gracie já trabalhou como tradutora de inglês e francês. Acabou fazendo carreira como juíza federal no Rio Grande do Sul. Casou-se por lá. Está divorciada há uma década. É mãe de Clara, 25 anos, advogada em Porto Alegre. Gosta de cozinhar, não freqüenta cabeleireiros, não pinta as unhas, tem poucos sapatos, só aparece de maquilagem leve e se veste sempre de terninhos claros, feitos sob medida por uma velha costureira gaúcha. Sua única extravagância conhecida foi há um ano mandar fazer uma reforma de R$ 133 mil em seu apartamento funcional de 523 metros quadrados. Só a banheira de hidromassagem custou R$ 3,3 mil. “É claro que eu vou colocar uma banheira lá”, disse ela na ocasião. “E tem que ser paga com dinheiro público sim, pois está em um imóvel público”.

A chegada de Ellen Gracie não é a única mudança no comando do Judiciário brasileiro. No dia 5 de abril, será empossado na presidência do Superior Tribunal de Justiça, onde são julgadas as principais ações ligadas a questões contratuais, o ministro Raphael de Barros Monteiro, de 66 anos e quatro décadas de Judiciário. O novo chefe da corte tem perfil bem diferente do antecessor Édson Vidigal. Monteiro é acadêmico e introspectivo. Vidigal é comunicativo e também político – nestas eleições, ele se lançará ao governo do Maranhão. Nos próximos dois anos, Barros Monteiro promete criar um marco na gestão do STJ com a simplificação dos procedimentos internos e o uso incondicional da informática. “Vamos agilizar as decisões”, promete. Tímido, Barros Monteiro não fala com políticos, advogados e tampouco com empresários. Até para se preservar.

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