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Setor hoteleiro não é mais onerado que locações por pessoas físicas

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Consultor Jurídico

Diante da tentativa da reforma tributária sobre o consumo de enquadrar pessoas físicas no regime de hotelaria, passou-se a discutir se há favorecimento para operações feitas por pessoa física frente às operações realizadas pelo setor hoteleiro. Importa analisar a incidência dos tributos sobre a renda e sobre o consumo no contexto atual e no contexto pós-reforma tributária sobre o consumo, para fins de verificar se efetivamente há tributação favorecida para algum dos setores frente ao outro.

No regime atual — antes da reforma tributária do consumo (EC 132/2023 e LC 214/2025) —, as locações de imóveis por pessoas físicas não constituem prestação de serviços. Sendo assim, não são tributadas pelo consumo. Há exclusivamente a tributação sobre a renda, por IRPF, sujeita à tabela progressiva, com alíquotas que variam de 7,5 a 27,5%.

Já as operações realizadas pelo setor hoteleiro são tributadas pela renda por meio de IRPJ e CSLL em alíquotas que somam 26% sobre o lucro real ou, no caso do lucro presumido, de sobre uma margem de lucro presumida equivalente a 32% da receita bruta. Também há incidência de tributos sobre consumo, 3,65% de PIS/Cofins e 2 a 5% de ISS incidentes sobre a receita bruta.

Não procede tese de que setor hoteleiro é mais onerado

É justamente diante dessa análise superficial de incidência tributária que se corre o risco de presumir que o setor hoteleiro é mais onerado, diante da maior incidência de tributos variados sobre a operação. Essa conclusão precipitada não se sustenta quando é feita a análise acerca das bases de cálculo dos tributos incidentes sobre ambas as operações.

No caso de operação realizada pessoa física, a base de cálculo do IRPF é o rendimento líquido integral obtido com a locação, admitindo-se apenas deduções restritas. Assim, a tributação incide sobre uma base praticamente total, correspondendo a uma proporção muito maior da receita auferida.

Já no caso das empresas que operam no setor hoteleiro, a tributação é incidente sobre uma base tecnicamente mais restrita. Embora o número de tributos seja maior, a base de cálculo da renda das empresas é muito menor, já que o IRPJ e a CSLL não recaem sobre a receita total, mas sobre o lucro efetivo ou presumido.

Dessa forma, ainda que o setor hoteleiro esteja sujeito a um número maior de tributos, a base econômica efetivamente tributada é mais restrita, resultando, em regra, em carga tributária global inferior àquela suportada por uma pessoa física que aufere rendimentos de locação.

Vantagem tributária de pessoa física é ilusória

Em síntese, a aparente vantagem tributária da locação por pessoa física é ilusória: a tributação incide sobre um valor mais amplo, com poucas deduções e sem regimes de compensação, enquanto os hotéis se beneficiam de bases reduzidas e regimes cumulativos ou presumidos que atenuam o impacto efetivo da tributação.

A reforma tributária sobre o consumo agravou ainda mais a tributação para as pessoas físicas que têm operação equiparada ao regime de hotelaria, que passarão a sofrer tributação por IBS/CBS, com alíquota setorial de referência de 16,5% sobre a receita líquida.

Ainda é preservado o tratamento diferenciado às pessoas físicas não caracterizadas como contribuintes, que são aquelas que auferirem receita anual inferior a R$ 288.000 ou realizem menos de três locações anuais.  Essas operações permanecem fora do campo de incidência do IBS e da CBS, sujeitando-se à tributação pelo IRPF.

Na prática, a base de incidência sobre a renda permanece ampla, e somam-se agora tributos sobre o consumo, que não existiam no regime anterior.

Veja-se que o setor hoteleiro, ainda que sujeito a IBS e CBS no mesmo regime específico, mantém vantagens estruturais relevantes:

  1. base de cálculo do IRPJ/CSLL reduzida (lucro presumido de 32% da receita) ou ajustável (lucro real);

  2. regime não cumulativo no IBS e CBS, com direito a créditos sobre insumos, energia, manutenção e serviços contratados; e

  3. carga tributária efetiva menor em proporção à receita total, pois a incidência se fragmenta sobre margens menores.

Conclusão

Quando se observa de forma simplória a multiplicidade de tributos incidentes sobre as atividades de hotelaria, chega-se à conclusão de uma eventual onerosidade tributária. Essa conclusão é corrigida quando analisada a base de cálculo dos tributos de cada operação, verificando-se que a carga suportada pelo setor hoteleiro já é inferior àquela incidente sobre os rendimentos de locação por temporada auferidos por pessoas físicas.

Portanto, é possível concluir que, do ponto de vista estritamente da tributação da renda, a atividade hoteleira revela-se estruturalmente menos onerada, tanto sob o regime de lucro real quanto sob o de lucro presumido, enquanto as pessoas físicas que exploram locações por temporada enfrentam uma incidência mais onerosa, que consome parcela expressiva do rendimento líquido. Diante desse contexto, ainda antes da reforma tributária do consumo, não havia qualquer favorecimento tributário em benefício das pessoas físicas, ao contrário, o modelo já lhes era mais gravoso.