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Salário mínimo e cesta básica ampliam inventário de Lula

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Por Angela Bittencourt

SÃO PAULO (Reuters) – O presidente Lula tem um belo inventário para exibir à Nação na partida para a corrida eleitoral de 2006.

A confiança do consumidor volta a crescer na cola do aumento da renda real e da queda do desemprego.

O novo salário mínimo de 350 reais –fortalecido em 13 por cento acima da inflação– entrará no bolso dos trabalhadores um mês antes do previsto e despejará na economia cerca de 1,25 bilhão de reais por mês, estima a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (Fecomercio).

O presidente Lula pode divulgar, antecipadamente portanto, que no seu governo o salário mínimo teve um avanço nominal de 75 por cento.

Esse dado já tem grande expressão, mas, daqui a dois meses, o presidente terá um aliado ainda mais emblemático: a cesta básica.

“Quando o presidente assumiu, a cesta básica custava 208 reais em São Paulo. Hoje, custa 211 reais. Em abril, este custo estará provavelmente abaixo de 208 reais. O real valorizado pela entrada de dólares no país e o início da safra vão baratear a cesta básica, que é uma referência de preço compreendida por toda a população”, explica o economista-chefe da Convenção Corretora, Fernando Montero.

Ele concorda que os indicadores econômicos de curto prazo garantem um cenário favorável ao governo, sobretudo porque no Brasil não é usual conhecer o patamar dos indicadores e, sim, a sua variação e elas são positivas e diversificadas.

No governo Lula a oferta de crédito disparou. As carteiras dedicadas às pessoas físicas saltaram 37 por cento em 2005 turbinadas principalmente pelo crédito consignado.

Este crédito garantido em folha de pagamento tornou-se inegável fonte de estímulo para assalariados empreendedores ou endividados que precisam de dinheiro e também para os bancos que encontraram nesta operação um atalho para o paraíso do risco zero.

O Produto Interno Bruto (PIB) de 2005 aponta para expansão de cerca de 2,3 por cento ante 2004. A expectativa de crescimento da ordem de 3,5 por cento em 2005, sustentada pelo mercado um ano atrás, esboroou e foi sepultada com a queda do PIB no terceiro trimestre.

“O resultado do ano ficou abaixo do esperado inicialmente, mas o quarto trimestre mostrará recuperação”, afirma Guilherme Maia, economista da Tendências Consultoria Integrada.

“Os indicadores antecedentes são positivos. Estimamos crescimento da produção industrial de 0,9 por cento em dezembro frente a novembro. No primeiro trimestre de 2006 o desempenho deve ser semelhante, mas a atividade será embalada principalmente pela demanda doméstica. A massa salarial cresce como resultado de ocupação e rendimento em expansão.”

REVISÃO DE UM CICLO

Apesar da frustração com o PIB em 2005, o mercado reconhece que o prognóstico inicial de variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) –projetada em 5,7 por cento há cerca de um ano– foi confirmado. O IPCA subiu 5,69 por cento.

Um ano atrás, o mercado não contava com a manutenção de juro tão alto pelo Banco Central e com o real tão valorizado –combinação considerada decisiva para segurar a inflação e um eventual surto expansionista via demanda agregada.

Mas no inventário do governo Lula já estão registrados cinco cortes consecutivos da Selic pelo Comitê de Política Monetária (Copom) que, de meados de setembro para cá, baixou a taxa em 2,50 pontos percentuais –abatendo dois terços da alta acumulada no ciclo de aperto monetário compreendido entre setembro de 2004 e setembro de 2005.

JURO ALTO E LIQUIDEZ GARANTIDA

O aperto monetário é responsabilizado pela fraca atividade, mas a crise política também fez a sua parte ao comprometer a confiança de empresários e consumidores.

É fato, porém, que a generosa taxa de juro forçou o governo a economizar, garantindo superávits primários elevados a ponto de convencer os investidores internacionais de que o Brasil é um grande e seguro negócio.

“Temos a maior taxa de juro do mundo e também os ativos de maior liquidez. E isto explica em parte a melhora do risco-país que busca equilíbrio entre 250 e 260 pontos-básicos”, lembra Montero.

Neste início de ano, o risco Brasil recuou quase 15 por cento, ante queda de 19 por cento em 2005 inteiro.

Risco baixo, juro alto e foco no crescimento, além de liquidez global abundande, explicam os recordes consecutivos alcançados pelo Ibovespa neste ano, de ganho nominal em torno de 15 por cento.

“RETRATO” QUE VALE R$1,0 TRILHÃO

A oferta de capital estrangeiro e a perspectiva de retorno elevado em qualquer aplicação financeira –ante inflação que o BC deve conduzir a 4,5 por cento em 2006– explicam o volume recorde de 10,98 milhões de contratos em aberto na Bolsa de Mercadorias & Futuros (BM&F) –com valor de referência de 1,0 trilhão de reais.

Este estoque reúne todas as modalidades de contratos negociados na bolsa de derivativos brasileira, onde os contratos de juro de 1 dia somam 590 bilhões de reais.

“Este é o retrato de um país onde o governo gasta 20 por cento do PIB com juros e aposentados e 7 por cento do PIB com saúde e educação”, comenta Fernando Montero.

O economista, com experiência de governo, explica que o aumento do salário mínimo garantido pelo governo corresponde à metade do custo médio do Bolsa-Família.

“Um governo que decide gastar um quinto do PIB com idosos e rentistas não pensa no futuro porque o Brasil investe muito pouco e tem, sim, uma distribuição de renda injusta.”

HÁ DINHEIRO PARA TUDO, MAS A CONTA SERÁ COBRADA

Fernando Montero lembra que hoje “o governo tem dinheiro para tudo”, mas pondera que a expansão de gastos tem conseqüências.

“Ao bancar um salário mínimo com efeito permanente, e que também contempla 16 milhões de aposentados, o governo coloca em risco os seus próprios programas assistencialistas que têm tirado brasileiros da miséria absoluta. Além disso, o governo diminui o espaço para a redução da carga tributária. Em 2005, a carga tributária federal e o ICMS cresceram 1,66 por cento do PIB.”

O economista lembra ainda que o juro também é uma despesa, mas alerta que esse mesmo juro é um dos instrumentos que o Banco Central dispõe para acomodar, ou evitar, o impacto do aumento de gastos do governo e tem, portanto, um caráter menos flexível do que se imagina.

“Um banco central têm quatro maneiras de administrar os efeitos de um governo que cresce na economia: juro alto, dólar baixo, carga tributária alta e inflação baixa. No Brasil, estamos no limite dessas possibilidades.”