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Receita contesta compra de créditos fiscais para quitar dívida no Refis

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Marta Watanabe De São Paulo

Quando o Programa de Recuperação Fiscal (Refis) foi aberto, no ano 2000, a Gerdau S/A viu no superparcelamento de tributos do governo federal uma alternativa econômica e de baixo risco para quitar seus débitos. A companhia desistiu de algumas ações judiciais, nas quais questionava a cobrança de contribuições sociais, e incluiu os valores envolvidos no Refis.

A empresa aderiu ao programa apresentando um débito total de R$ 112,789 milhões. O montante incluiu os valores não recolhidos ao Programa de Integração Social (PIS) e à Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), além de juros e multa. Ao aderir ao Refis, a Gerdau usou um dos benefícios concedidos pelo programa: a possibilidade de pagar a parte de juros e multa com créditos fiscais detidos pelas empresas. Mais do que isso, o Refis permitiu que as empresas que não tivessem créditos próprios suficientes pudessem adquirir créditos de outras companhias e usá-los para abater a dívida.

Foi o que a Gerdau fez. Comprou de terceiros créditos no valor de R$ 57,04 milhões. Na negociação conseguiu um deságio de 92,37%. Ou seja, pagou por eles apenas R$ 4,35 milhões. A companhia abateu os créditos adquiridos de terceiros do débito total de R$ 112 milhões incluído no Refis e ficou com um saldo de R$ 55,75 milhões a serem pagos em 60 parcelas mensais.

A Gerdau liquidou as parcelas devidas, mas o Fisco não considera o assunto resolvido. A Receita Federal diz que, do total de créditos fiscais adquiridos pelo grupo, R$ 40,12 milhões foram aproveitados ilegalmente, porque os valores foram comprados de terceiros, que tinham débitos com o Fisco.

Segundo a Receita, as empresas que venderam os créditos deveriam ter saldado as suas próprias dívidas tributárias antes de negociá-las com a Gerdau.

Em nota enviada ao Valor, a empresa diz que a regra não existia quando aderiu ao Refis e que os créditos são idôneos. O assunto virou alvo de ação judicial ainda sem decisão definitiva.

O caso da Gerdau não é único. Mesmo com condições consideradas generosas – ou talvez em função delas – , os superparcelamentos de tributos federais são alvo de ações judiciais ou discussões administrativas entre empresas e Fisco. Além da Gerdau, companhias como Teka e Copel têm até hoje questões ainda não resolvidas em relação ao Refis ou ao Parcelamento Especial (Paes), outro superparcelamento oferecido pelo governo federal em 2003.

De forma semelhante à Gerdau, a Copel comprou créditos de terceiros para reduzir a dívida tributária. Dos R$ 89,77 milhões que a empresa colocou no programa, R$ 45,77 milhões eram juros e multas saldados com créditos comprados das empresas Laps Patrimonial e Unimar Supermercados.

Como a Receita não concluiu a análise do processo de transferência de créditos até hoje, cinco anos após a adesão ao Refis, a empresa resolveu provisionar os valores envolvidos. Ou seja, a empresa descontou o valor de seus resultados. O valor líquido da provisão é de R$ 68,79 milhões, com atualização até junho de 2005.

Segundo a consultora Danila Maria Bernardi, da ASPR Auditoria e Consultoria, os casos da Gerdau e da Copel são um reflexo do que se tornou uma das principais discussões relacionadas ao Refis: a compra de créditos de terceiros. “Esse benefício foi muito utilizado, mas foi o que mais gerou polêmica. O Fisco costuma questionar o cálculo do débito e também a natureza, origem ou período a que se refere o crédito fiscal” diz a consultora. Danila explica que a legislação do Refis permitiu somente o aproveitamento de determinados créditos fiscais e restringiu também a data de origem dos valores.

A consultora lembra que a possibilidade de comprar créditos de terceiros gerou um mercado paralelo, no qual o deságio chegava a 80%, em média.
A advogada Isabela Bonfá de Jesus, do escritório Braga & Marafon, acredita que as empresas que tiveram a compra de créditos questionada pela Receita têm bons argumentos de defesa. “Se as normas do Refis foram cumpridas, o contribuinte adquiriu os valores de boa fé e, por isso, não pode ser penalizado.”

A Teka tem uma discussão diferente da Gerdau e da Copel. Ao aderir ao Refis, a tecelagem se comprometeu a pagar mensalmente 1,2% de sua receita para saldar a dívida incluída no programa. As projeções feitas por analistas de mercado na época indicavam que a empresa, dependendo do comportamento de seu faturamento, poderia saldar seu débito em até 96 anos. Como atrasou alguns pagamentos, a empresa ficou sujeita a exclusão.

A companhia estava nessa situação quando surgiu, em 2003, o Paes, mais conhecido como Refis 2. A empresa aderiu ao novo programa de parcelamento de tributos mas, paralelamente, questionou na Justiça Federal, em São Paulo, a suposta cobrança de juros sobre juros no Refis.

Por enquanto, a Teka conta com uma liminar a seu favor para compensar o que teria sido pago a mais em juros no Refis. A companhia quer abater o que alega ter pago a mais com as parcelas a vencer do próprio Refis e do Paes. A empresa declara no balanço débito de R$ 83,25 milhões, mas a Teka aguarda a definição judicial dos valores devidos.

Para a consultora Danila, a discussão de juros pelas empresas que aderiram aos parcelamentos é delicada. “Tanto o Refis quanto o Paes tinham condições mais favoráveis que os programas normais de parcelamento. Além disso, nenhuma empresa era obrigada a aderir a eles. Portanto, quando participavam dos parcelamentos, elas estavam aceitando as condições impostas.”

Manoel Felipe Rego Brandão, titular da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional, órgão responsável por defender a União na Justiça, não comentou os casos específicos, mas diz que os processos de adesão ao Refis estão sendo analisados de forma criteriosa e que está tranqüilo em relação aos questionamentos existentes.

Procuradas, a Copel e a Teka não se manifestaram.

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