Reavaliação criou reserva de R$ 40 bi
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Nelson Niero e Graziella Valenti
As companhias abertas brasileiras criaram um saldo estimado em R$ 40 bilhões em reservas patrimoniais que poderão simplesmente desaparecer no ar. Essa bomba de efeito retardado está acoplada à nova lei contábil, que entrou em vigor em 1º de janeiro e eliminou a chamada reavaliação espontânea de ativos.
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O texto da lei, que proíbe novas reavaliações, dá duas opções às empresas: manter o saldo constituído em levantamentos passados "até sua efetiva realização" ou estorná-lo até o fim do exercício social em que a lei entrar em vigor, ou seja, neste ano.
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Levantamento feito pela Fundação Instituto de Pesquisas Contábeis, Atuariais e Financeiras (Fipecafi) mostra que 85 empresas têm reserva superior a R$ 100 milhões cada, num total de R$ 29,8 bilhões, e 294 companhias têm saldo entre R$ 10 milhões e R$ 100 milhões, somando R$ 9,3 bilhões.
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Introduzida pela Lei das S.A., de 1976, a reavaliação de ativos tinha a boa intenção de trazer o números do balanço para mais perto da realidade do mercado. No entanto, acabou sendo transformada num instrumento legal de maquiagem de balanços.
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"Reavaliação é um instituto bom, mas que desaparece por mau uso. O que já se fez nesse país com reavaliação é brincadeira", diz Eliseu Martins, professor da Fipecafi que participou da elaboração do projeto de mudança da parte contábil da Lei das S.A.
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Muitas empresas lançaram mão desse recurso para inflar o patrimônio deteriorado por resultados ruins, superavaliando seus ativos com o respaldo de laudos pouco confiáveis. Além disso, a prática prejudicou a comparabilidade dos balanços, porque cada empresa fazia do jeito que bem entendia e outras simplesmente não fizeram.
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O saldo de reavaliação, explica o professor da fundação Ariovaldo dos Santos, pode ser estornado integralmente até o final desde ano ou mantido. Caso a companhia opte por ficar com a reserva, ela permanecerá registrada até desaparecer, na medida em que os ativos que foram reavaliados desaparecerem por depreciação ou pela venda. "A lei não mandou desfazer o saldo", completa Martins.
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Para Guillermo O. Braunbeck, especialista da consultoria contábil e financeira Hirashima & Associados, existem indícios históricos de que a reavaliações eram motivadas por interesse na melhoria dos índices financeiros da empresa. Porém, ressalva ele, havia casos fundamentados em questões econômicas pertinentes. Não há como estimar o que dos R$ 40 bilhões tem efetivamente tem substância e o que simplesmente foi criado do nada.
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A reavaliação de ativos é um procedimento semelhante à novíssima "redução do valor recuperável dos ativos" ("impairment"), prevista na nova lei e regulamentada recentemente pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), em conjunto com o Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC).
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A diferença é que a reavaliação de ativos era utilizada quase exclusivamente para aumentar o valor de um bem registrado. Já o impairment é a baixa no registro de um ativo porque a companhia julga que não pode recuperar o valor contabilizado nem pela venda do bem e nem pelo seu uso.
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As companhias que tiverem saldo de reavaliação registrados nos seus ativos mas que, ao longo do tempo, julgarem que não podem mais conseguir transformar o bem em lucro equivalente, terão de fazer uma baixa contábil do ativo reavaliado. Nesses casos, a redução é feita contra a conta da reserva, que sofre uma diminuição, explica Santos, da Fipecafi.
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Braunbeck, da Hirashima & Associados, acredita que as reservas de reavaliação são ativos potencialmente alvos de impairment, especialmente, em empresas que tiverem margens decrescentes de lucratividade ou que estiverem mostrando prejuízo. Segundo ele, caso haja um grande movimento de estorno desses saldos nesse ano, é um indício de que o bem seria alvo de uma baixa contábil
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