País explora microcrédito de forma ainda tímida
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A maior parte dos recursos emprestados, ou R$ 600 milhões, provém dos 2% dos depósitos à vista captados pelas instituições financeiras (exceto cooperativas de crédito) de acordo com a lei 10.735
Sérgio Bueno
Segundo Soares, existem cerca de 16 milhões de pequenas unidades produtivas no Brasil, das quais 13 milhões são formadas por trabalhadores por conta própria e, do total, pelo menos 7 milhões são clientes potenciais do microcrédito. Este público demanda cerca de R$ 12 bilhões em pequenos empréstimos, mas o total financiado até dezembro de 2006 era inferior a R$ 1,1 bilhão para 1,1 milhão de clientes, com operações médias de R$ 1,7 mil.
A maior parte dos recursos emprestados, ou R$ 600 milhões, provém dos 2% dos depósitos à vista captados pelas instituições financeiras (exceto cooperativas de crédito) de acordo com a lei 10.735, de 2003. Mesmo assim, o valor representa metade do teto de aplicação porque os bancos preferem “esterilizar” parte dos recursos no Banco Central a operar com os riscos e custos do sistema, apesar dos juros médios cobrados de 4% ao mês, explica o consultor.
O Banco do Nordeste, com o sistema “Crediamigo”, comparece com R$ 170,6 milhões no bolo total de empréstimos e as cooperativas de microempresários, com R$ 145,9 milhões. ONGs, Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip), sem fins lucrativos, e fundos públicos entram com R$ 52,8 milhões e as Sociedades de Crédito ao Microempreendedor (SCMs), que podem visar ao lucro, com R$ 47,7 milhões.
Afora a exigibilidade dos 2% dos depósitos à vista, os grandes bancos privados ainda estão engatinhando no microcrédito, constata Soares. De acordo com o consultor, no fim do ano passado apenas Unibanco, ABN AMRO, Santander Banespa e Itaú operavam na modalidade, com empréstimos totais de R$ 71,7 milhões.
O consultor atribui ainda a baixa oferta de microfinanciamentos ao pequeno apetite das Oscips em criar ou adquirir o controle de SCMs como forma de aplicar os lucros obtidos nas operações com clientes de porte intermediário em novos empréstimos para as camadas de renda mais reduzida. Segundo Soares, muitos gestores de Oscips têm receio de operar com SCMs porque “não conhecem” muito bem o funcionamento delas.
Não é o que pensa Luiz José Bueno de Aguiar, da Associação Brasileira dos Dirigentes de Entidades Gestoras e Operadores de Microcrédito (Abcred). De acordo com ele, por serem fiscalizadas pelo BC, as Sociedades de Crédito ao Microempreendedor têm custos operacionais e de controle de qualquer financeira mas só podem oferecer um único tipo de produto e emprestar no máximo R$ 10 mil por cliente.
“É preciso repensar o modelo, permitir que as SCMs trabalhem com seguros e crédito consignado, por exemplo, para balancear melhor as carteiras”, diz Aguiar. A burocracia para a constituição das sociedades de crédito é outro entrave, relata. Segundo ele, enquanto há cerca de 260 Oscips em operação no Brasil, o número de SCMs não passa de 50.
Para o diretor de Finanças do Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), Carlos Alberto dos Santos, outro problema é a dificuldade ainda existente das instituições financeiras em emprestar para empreendimentos informais, crescentes no país. “Frente a este tipo de cliente, a tecnologia tradicional de crédito, com processo de análise de risco baseada em holerite ou balanço contábil, fracassou”.
Segundo ele, o uso crescente de modalidades como garantia solidária e a “janela de oportunidade” para a formalização aberta pela Lei Geral da Micro e Pequena Empresa podem reverter gradativamente o quadro. Mas, por enquanto, ele recomenda uma análise mais isenta dos empreendimentos informais. “A maior parte da informalidade é uma questão social e econômica e não um caso de polícia”, afirma.