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O que representa a desoneração da MP 281?

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“A MP eliminou a distorção de o investidor estrangeiro contribuir com o custeio de serviços à disposição apenas do residente”

Por Elisabeth Libertuci

Cumprido o prometido. O residente no exterior que adquirir títulos públicos federais terá os rendimentos por eles produzidos desonerados do Imposto de Renda (20%). Em termos práticos, então, pode-se dizer que o rendimento do título público ao residente no exterior valorizou-se em pelo menos 20%.
Explicando melhor, suponha que determinado título público esteja atrelado à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), estimada, somente para exemplificar, em 18% ao ano.

Seguindo o exercício, admita-se que o título público tenha sido adquirido por R$ 100 no mercado primário (emissão do título pelo próprio Estado), o que implicaria no rendimento nominal de R$ 18. Anteriormente à publicação da MP 281/2006, de 15 de fevereiro, o residente no exterior embolsaria o rendimento líquido de R$ 14,4 e entregaria aos cofres públicos brasileiros, a título de IR, o valor de R$ 3,6.

O curioso é quem pagava ao investidor estrangeiro R$ 18 também dele recebia R$ 3,6. Poder-se-ia afirmar, então, que R$ 3,6 sequer chegava a sair dos cofres públicos, tratando-se tão somente de lançamento contábil? Possivelmente não, na medida em que enquanto R$ 3,6 vinha sendo arrecadado a título de imposto, em tese, embora não entregue ao residente no exterior na forma de rendimento, tinha de ser destinado para custear serviços públicos essenciais, saúde, moradia, educação, etc, etc, etc.

Seguindo o raciocínio, a MP 281/2006 nada mais fez do que eliminar a distorção de o investidor estrangeiro ter de contribuir com parte do rendimento obtido na aquisição de título público federal no custeio de serviços públicos essenciais colocados apenas à disposição do residente no Brasil.

A questão que levo à reflexão, porém, é outra. Se quem paga rendimentos sobre títulos públicos confunde-se com quem recebe parte desses rendimentos a título de IR, em quanto o Estado estaria se endividando quando lança títulos públicos federais? No exemplo formulado: R$ 18 ou R$ 14,4? Como os R$ 3,6 não são utilizados na sua plenitude para abater a dívida externa ou interna, forçosa a conclusão de que o custo do empréstimo dos títulos federais sempre foi o valor líquido da remuneração, descontado o IR de 20% incidente sobre o rendimento.

Indiscutivelmente, pode-se afirmar que a partir da MP 281/2006 o custo do Estado ao ter como credor o investidor estrangeiro passou a ser, regra geral, a taxa Selic, definida pelo Banco Central do Brasil como “a taxa média ajustada dos financiamentos diários apurados no Sistema Especial de Liquidação e Custódia para títulos federais” (vide a respeito Circulares do Banco Central 2.868/99 e 2.900/99).

Medida reacendeu a polêmica quanto à impertinência da Selic como indexador de tributos e contribuições

E quando o Estado remunera o investidor nacional que adquire títulos públicos? Salvo maior engano, o custo do financiamento é a remuneração líquida descontada do IR de 20%.

Como é sabido, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) levou anos para decidir se a taxa Selic é apropriada para remunerar o Estado no caso de tributos pagos em atraso pelo contribuinte. De início, o entendimento foi pela sua inconstitucionalidade, sob a alegação de ser inaplicável a equiparação dos contribuintes com os aplicadores de títulos públicos, já que estes praticam ato de vontade e aqueles são submetidos coercitivamente a ato do império (Resp. 215.881, 1ª turma, relator ministro Franciulli Netto).

Trocando em miúdos, entendia o STJ que não é pelo fato de o Estado estar endividado e precisar se valer de financiamento perante a iniciativa privada que essa mesma iniciativa privada, quando se encontra na condição de devedora do Estado, teria de a ele pagar o mesmo custo do dinheiro (taxa Selic).

A tese, contudo não vingou. O posicionamento atual do STJ é pela pertinência de o devedor de tributos ter de remunerar o Fisco na exata proporção de que o Estado remunera o particular quando investe em títulos públicos (AgRg no Resp nº 449.545, 1ª Turma, relator Luiz Fux).

De fato, a remuneração ao investidor estrangeiro a partir da MP 281/2006 é a taxa Selic. Pergunto, porém: qual o efetivo endividamento do Estado quando necessita captar recursos do contribuinte residente no Brasil? A taxa Selic ou essa remuneração descontada de 20% (IR sobre rendimentos produzidos por títulos públicos federais obtidos apenas pelo investidor nacional após a edição da MP 281/2006).

Se sua resposta para a minha indagação é de que o custo do endividamento do Estado para o investidor nacional é a taxa Selic abatida de 20%, você acaba de concluir que o contribuinte devedor de tributos e contribuições, paga ao Estado 20% a mais do que o Estado remunera quando está na condição de captação de recursos. Se a desoneração tributária sobre a remuneração de títulos públicos não for extensiva ao investidor nacional, será que o Fisco poderá continuar a exigir sobre o tributo pago em atraso a taxa Selic, ou terá de conceder a seu credor o desconto de 20%, já que optou por remunerar melhor o investidor estrangeiro do que o nacional?

Ouso afirmar que a MP 281/2006 reacendeu a polêmica quanto à impertinência de a taxa Selic servir de “indexador” de tributos e contribuições pagos em atraso. Quando muito, essa cobrança está “inchada” em 20%.

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