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Mais um imposto pode ser criado

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Gazeta Mercantil

7 de Agosto de 2007 – Na nova estocada, o IVV surgirá, com prejuízos aos comerciantes e às prefeituras. O governo cogita propor em seu novo projeto de reforma tributária a criação de dois Impostos de Valor Adicionado (IVA): um federal, que unificaria o PIS, Cofins, IPI e a Cide, e outro estadual, que integraria o ISS à base do ICMS. E neste mesmo projeto, pasmem, pode ser criado um novo imposto sobre essa mesma base, o Imposto sobre Vendas a Varejo (IVV).

Um aspecto a ser realçado neste projeto do IVA dual, que deve ser encaminhado ao Congresso Nacional a partir de agosto, é que o IVV será criado para compensar os municípios pela perda do ISS, já que a base de serviços seria transferida para a esfera do IVA estadual.
O IVV é um tributo pago no último estágio do processo de fabricação e distribuição de mercadorias, como ocorre nos Estados Unidos. É adicionado na nota fiscal quando o consumidor adquire um bem em um estabelecimento varejista. Ou seja, ao efetuar uma compra em uma loja, farmácia ou restaurante, por exemplo, o cliente teria o imposto somado ao preço final e o comerciante seria o responsável pelo seu recolhimento junto ao fisco municipal.
A proposta de se cobrar um imposto municipal na ponta do consumo foi aventada em 1999 através do substitutivo à PEC 175/95, apresentado pelo deputado Mussa Demes (DEM/PI). Na nova estocada tributária que se ensaia, a proposta do IVV deve ser resgatada, e isso trará prejuízos aos comerciantes e às prefeituras.
O IVV alcançaria milhões de pequenos estabelecimentos na cadeia varejista de comércio, impondo-lhes novos custos de administração tributária e subtraindo-lhes capital de giro e pressionado suas margens de lucro.
Se de um lado a proposta em estudo causa apreensão aos varejistas, de outro os prefeitos devem ver no projeto um motivo de preocupação, já que teriam de abrir mão da receita que mais cresceu entre 2002 e 2006 (a arrecadação do ISS aumentou 11,4%) e, como compensação, passariam a cobrar um tributo absurdamente complexo como o IVV. Ou seja, os municípios perderiam a base "serviços", em expansão no mundo globalizado e terceirizado da atualidade, e teriam pesados custos de administração e fiscalização de um imposto no qual não têm tradição.
Cabe citar que há estimativas apontando que 30% das prefeituras perderão um terço ou mais de suas receitas próprias se o ISS for incorporado ao IVA. Na região paulista do Grande ABC, por exemplo, a expectativa dos prefeitos é que as perdas sejam da ordem de R$ 400 milhões.
O IVV é um tributo que não se enquadra na tradição tributária brasileira. Num país onde a sonegação destroçou a ética tributária e onde a evasão passou a ser costume socialmente ratificado, como imaginar que o IVV seja adequadamente arrecadado em cada um dos milhões de pontos-de-venda a varejo? Quem no Brasil já não tomou conhecimento, ou foi agente, de práticas como a negociação do preço de mercadorias "com nota" e "sem nota"? Qual o custo para as prefeituras adequarem suas máquinas de fiscalização a esse imposto tão vulnerável a sonegação? Enfim, estas são questões que devem ser colocadas quando se cogita criar um tributo potencialmente suscetível a fraudes.
Esse sistema tributário caminha na contramão de tudo o que a sociedade espera. O contribuinte quer menos tributos, menos burocracia, menos fiscais e menos corrupção. Nada disso será conseguido se o IVV for aprovado. Trata-se de uma proposta burocrática, convencional e conservadora. Vai prejudicar os municípios e infernizar a vida do comércio varejista e do consumidor final. Com o IVV, cria-se uma combinação perfeita para gerar novos focos de sonegação, de evasão e de corrupção. O deformado sistema tributário brasileiro ficará ainda mais horripilante.
Cabe lembrar que em dezembro de 2002 o relator da PEC 474/01 – Imposto Único Federal, deputado Carlos Eduardo Cadoca (PMDB-PE) – expôs que "mesmo nos Estados Unidos reconhece-se que a sonegação do "sales tax" (imposto sobre sobre vendas) é generalizada e o problema só não é mais grave porque lá a carga tributária sobre o consumo é uma das mais baixas do mundo". Ele cita como fonte dessa informação uma reportagem de David Cay Johnston, publicada no The New York Times em 5 de junho de 2002, e conclui que "entre nós o problema seria gravíssimo, pois a tributação do consumo é a principal fonte de financiamento do Estado brasileiro".
A instituição de um tributo como o IVV vai aprofundar as graves anomalias sobre a economia do País provocadas pela caótica estrutura tributária. O novo imposto é um golpe contra os municípios, um abuso contra os comerciantes e uma afronta contra os contribuintes em geral.

 
(Gazeta Mercantil/Caderno A – Pág. 3)(Marcos Cintra Cavalcanti de Albuquerque – Professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas. Próximo artigo do autor em 5 de setembro)

 

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