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Golpe tributário

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A emenda reafirma o dispositivo constitucional que reserva à Justiça do Trabalho decidir sobre a legalidade de vínculos empregatícios

Não é sempre que em um conflito uma das partes acena com uma proposta supostamente conciliadora e, na prática, agrava a situação em torno da qual ocorre o desentendimento. Pois é o que o governo conseguiu com o projeto de lei mandado na semana passada ao Congresso em troca do veto à emenda nº 3, aprovada por larga margem de votos por deputados, senadores e incluída na lei de criação da Super-Receita.

A emenda apenas reafirma o dispositivo constitucional (artigo 114) que reserva à Justiça do Trabalho o poder de decidir sobre a legalidade de vínculos empregatícios e de trabalho entre contratantes e prestadores de serviço.

Mesmo assim, o presidente Lula foi levado a vetar a emenda, pressionado pela Receita Federal e por sindicatos. Os dois pelo mesmo motivo: arrecadação. A Receita, por querer taxar como pessoas físicas os profissionais que se organizam como pessoas jurídicas e são contratados como tais; os sindicatos, porque vêem nessa taxação uma oportunidade de aumentar o ingresso do dinheiro carimbado do imposto sindical.

Em nome desses interesses, o presidente vetou uma emenda lastreada na Constituição – algo de corar qualquer estudante de direito. Para sustentar o veto, chegou-se a acusar a emenda de impedir os fiscais, do Trabalho e da Receita, de agirem – um argumento falso. Nenhum fiscal estará proibido de fiscalizar. Ele apenas não poderá agir como juiz, como já estabelece a Carta, e a Receita se recusa a obedecer.

Diante da péssima repercussão do veto, o governo acenou com um projeto de lei para alegadamente esclarecer o papel da fiscalização. Mas, encaminhado pelo ministro Guido Mantega, da Fazenda, o projeto piora o quadro, por ser mais draconiano.

Agora, em vez de apenas as PJs (pessoas jurídicas) serem alvo dessa fiscalização autoritária, quaisquer "atos ou negócios jurídicos" de pessoas físicas e empresas estarão passíveis de punição caso a Receita os considere destinados a não pagar impostos. A Constituição continua sendo desrespeitada, pois, pelo projeto, caberá ao delegado da Receita decidir sobre a punição. É o Fisco se sobrepondo à Justiça, numa flagrante ilegalidade, uma agressão ao estado de direito.

A Receita, na verdade, aproveitou a oportunidade dessa lei para tentar emplacar um antigo projeto, que é o de poder desconsiderar qualquer medida tomada pelo contribuinte para pagar menos impostos, mesmo dentro da lei.

Não há, portanto, como aprovar este projeto. A única alternativa a favor da sociedade é o Congresso derrubar o veto do presidente.

 

 
Fonte: O Globo
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