Logo Leandro e CIA

É preciso questionar tributos imediatamente

Publicado em:

Plinio J. Marafon

Na época em que as teses tributárias levadas ao Poder Judiciário tinham mais sucesso, em virtude das trapalhadas legislativas dos poderes constituídos, era normal o administrador mais conservador esperar que a jurisprudência se consolidasse em seu favor, pagando os tributos discutidos para depois recuperá-los através de restituições ou compensações.

Essa atitude se justificava, em certos casos, porque essa demora na atitude pró-ativa não gerava grandes prejuízos financeiros. Vejamos alguns exemplos. O PIS sobre o faturamento era cobrado com seis meses de atraso, sem correção monetária, pela Lei Complementar nº 7, de 1970. Em julho de 1988, dois decretos-leis – o Decreto-lei nº 2.445 e o Decreto-lei nº 2.449 – alteraram a sistemática, eliminando aquela vantagem inflacionária. Em 4 de março de 1994 foi publicado o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) considerando esses decretos-leis inconstitucionais, e em 10 de outubro de 1995 foi publicada a resolução do Senado que os suspendeu.

A jurisprudência administrativa entendeu que o prazo de cinco anos para pedir de volta o que foi pago a mais poderia ser contado a partir da data da resolução do Senado. Portanto, aqueles que não discutiram judicialmente as leis de 1988 puderam recuperar o PIS pago a maior protocolando seus pedidos até 10 de outubro de 2000 e abrangendo todo o período da ilegalidade – de julho de 1988 até março de 1996, quando entrou em vigor a Medida Provisória nº 1.212, de 1995.

Durante 1989 e 1990 três leis aumentaram o Finsocial de 0,5% para 1%, 1,2% e finalmente para 2%. Em 2 de abril de 1993 o Supremo decidiu que esses aumentos foram inconstitucionais. Mas até hoje não foi aprovada a resolução do Senado que os devia suspender. Assim, o Conselho de Contribuintes tem considerado que o prazo qüinqüenal para pedir a restituição se conta desde 30 de setembro de 1995, data da Medida Provisória nº 1.110, que reconheceu a ilegalidade da cobrança. Portanto, aqueles que esperaram o desfecho da controvérsia puderam protocolar o pedido até 30 de setembro de 2000 e pedir de volta o indevido desde 1989 até 30 de dezembro de 1991, quando entrou em vigor a Lei Complementar nº 70, que criou a Cofins.

Com a edição da Lei Complementar nº 118, de 2005, seu artigo 3º estabelece que as restituições e compensações de tributos pagos indevidamente sempre e somente levarão em conta a data do pagamento desses tributos, perdendo-se aquele trunfo de esperar até cinco anos para pedir de volta e ainda retroagindo a partir de datas como a de resoluções do Senado ou de leis e atos normativos que venham a reconhecer a ilegalidade da cobrança.

Se estivesse em vigor essa lei complementar à época das discussões acima exemplificadas, nossos administradores cautelosos teriam perdido todo o PIS e o Finsocial pagos a maior, se tivessem protocolado as restituições somente em 2000. E teriam perdido alguns anos se tivessem entrado com seus requerimentos imediatamente após a resolução do Senado e a Medida Provisória nº 1.110.

——————————————————————————–
Doravante todas as teses serão boas, ao menos até os tribunais superiores se posicionarem de forma definitiva
——————————————————————————–

Ainda há uma polêmica nos meios judiciários sobre se a Lei Complementar nº 118 se aplicará somente aos processos iniciados a partir da data da sua publicação, em 9 de junho de 2005, ou para os tributos pagos indevidamente depois dessa mesma data.

De qualquer modo, pretendemos chamar a atenção dos administradores da empresas para o fato de que houve um retrocesso pró-fisco na sistemática de recuperação de tributos indevidos, obrigando-os praticamente a questionar essas cobranças controvertidas desde o início, para não haver prejuízos irreversíveis posteriormente.

Basta ver a tese da não-incidência do PIS/Cofins sobre o ICMS, que atualmente está sendo julgada no Supremo, com seis votos declarados a favor do contribuinte. Se a corte se definir pró-contribuinte, só nos restará pedir de volta as contribuições pagas a maior nos últimos cinco anos, extensivas ao PIS/Cofins sobre o Imposto Sobre Serviços (ISS), dentre outros. Diversamente, se tivéssemos ingressado com a ação judicial ou administrativa anteriormente (a Receita Federal sempre entendeu que o PIS e a Cofins deviam incidir sobre o ICMS e o ISS), estaríamos recebendo de volta valores infinitamente superiores.

Assim também se dá, por exemplo, com o crédito-prêmio de IPI sobre exportações, pendente de uma definição, no Superior Tribunal de Justiça (STJ), sobre se terminou em 1990 ou vale até hoje. Ou com o Funrural sobre as compras de produtos rurais, cuja inconstitucionalidade já tem cinco votos no Supremo. O Supremo ainda não se posicionou conclusivamente também sobre o crédito presumido de insumos adquiridos com 0% de IPI (a disputa já tem seis votos contra o contribuinte), sobre a dedução da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) perante o Imposto de Renda (disputa com placar de um a um) e sobre o limite de compensação dos prejuízos fiscais em 30% do lucro. Já nos Tribunais Regionais Federais (TRFs) está em andamento a disputa sobre o abatimento integral de compras no PIS/Cofins não-cumulativo.

E se o acionista ou conselheiro questionar o administrador porque este não discutiu algum desses temas anteriormente, como ele irá se justificar? A rigor, doravante nenhuma tese será mais ou menos estimulante, promissora ou perdedora. Todas serão boas teses, ao menos até os tribunais superiores se posicionarem definitivamente. Ninguém poderá se abster de contestar tributos vagamente inconstitucionais, pelo simples e fatídico risco de a tese vingar e não poder recuperá-los desde o início da cobrança indevida.

Quanto às teses que estão pendentes de solução nos tribunais superiores, devem as empresas ingressar imediatamente com medidas preventivas visando interromper a prescrição, para tentarem salvar o qüinqüênio anterior, como medida paliativa, se comparada com aquelas que se anteciparam desde há muito tempo atrás, quando as teses surgiram no meio jurídico. E ficarem sempre atentas a novas proposições jurídicas, frutos da persistência dos estudiosos em buscar falhas legais que venham a beneficiar os contribuintes, até como “consolo” ante essa carga tributária extorsiva de que são vítimas.

Plinio J. Marafon é advogado e sócio do escritório Braga & Marafon Consultores e Advogados

Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações