Construção civil já reage à estímulos e cresce
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Sergio Lamucci, Raquel Salgado e Paulo Henrique de Sousa De São Paulo
Depois do péssimo desempenho de 2005, a construção civil dá mostras importantes de reação no começo deste ano. Há sinais de que o setor já começa a responder ao aumento de gastos públicos em infra-estrutura, ao pacote de R$ 18 bilhões para o segmento e à continuidade do crescimento da renda. O comportamento positivo da construção, que responde por 60% da formação bruta de capital fixo (FBCF), é alentador para o investimento, ressaltam os analistas.
A fabricante de revestimentos cerâmicos Cecrisa já está comemorando os investimentos em construção. No primeiro bimestre do ano as vendas para o mercado interno cresceram 24,4%. Rogério Sampaio, presidente da empresa, diz que as medidas adotadas pelo governo, como redução do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) de uma cesta de produtos para o setor, ainda não refletiram na indústria, mas estão contribuindo para um clima mais otimista.
Do lado de máquinas e equipamentos (os 40% restantes da FBCF), o quadro não é tão róseo, uma vez que a produção doméstica de bens de capital dá sinais de perda de fôlego. No entanto, o câmbio valorizado tem estimulado a importação desses produtos, que cresce com força no início do ano, indicando que boa parte das empresas continua a ampliar sua capacidade produtiva, ainda que preferencialmente por meio de compras externas .
Para o economista-chefe da corretora Convenção, Fernando Montero, os números da construção civil no começo do ano mostram um quadro de expansão. Em janeiro, a produção de insumos típicos cresceu 7,2% em relação ao mesmo mês de 2005, um resultado forte, afirma ele, dando continuidade ao observado em dezembro (quando houve aumento de 7% ante o mesmo mês de 2004). “Há uma história consistente de recuperação no setor de construção”, afirma ele. Montero acredita que o setor já se beneficia do crescimento dos gastos públicos e do pacote de R$ 18 bilhões para a construção.
“As obras públicas e o pacote devem estimular o segmento, que pode crescer 6,5% neste ano”, afirma a economista Lygia de Salles Freire César, da Rosenberg & Associados. Em 2005, a expansão foi de apenas 1,3%. Lygia lembra ainda outro indicador de que o setor vai bem neste ano. Em janeiro, a produção de bens de capital para construção aumentou nada menos que 25,1%.
O diretor de incorporação da Gafisa no Rio de Janeiro, Francisco Pedroso, diz que é grande a demanda reprimida por imóveis residenciais e comerciais, e que as construtoras certamente estão aproveitando esse momento. A Gafisa, por exemplo, está lançando agora o Sun Plaza, duas torres com 300 salas comerciais, com valor geral de vendas de R$ 32 milhões, na Barra da Tijuca.
As salas custam a partir de R$ 96 mil e podem ser financiadas em até 100 meses. Otimista, Pedroso diz que vai lançar as duas torres ao mesmo tempo. Segundo ele, os bancos estão cada vez mais dispostos a financiar o setor da construção, seja via construtoras, ou diretamente aos proprietários. Essa disposição forma um cenário positivo para o resto do ano, já que a maior parte da demanda reprimida e do déficit habitacional está nas classes média e baixa. Ele conta que a novidade no setor comercial é a volta dos investidores privados, dispostos a destinar uma parte dos recursos para o setor imobiliário.
Nem todas as empresas voltadas para o setor começaram o ano com força. A Quartzolit Weber, fabricante de argamassa, e a Eliane, que faz pisos e revestimentos, ainda não sentiram aumento nas encomendas, mas esperam para março um fôlego novo nas vendas. “Estamos extremamente otimistas”, diz Antonio Carlos Loução, diretor comercial da Eliane.
Além do pacote do governo federal para a construção civil, o executivo lembra que os Estados de Santa Catarina e São Paulo reduziram recentemente as alíquotas de ICMS que incidem sobre os produtos cerâmicos. “Janeiro e fevereiro não foram muito fortes. Mas mesmo assim já vendemos produtos de maior valor agregado”. Para 2006, a Eliane espera um crescimento de 10% na venda de cerâmica e argamassa, um resultado acima dos 8% do ano passado.
O economista Sérgio Vale, da MB Associados, aponta outro fator que vai ajudar a construção civil em 2006: a continuidade do crescimento da massa salarial, que deve ganhar impulso significativo com o reajuste do salário mínimo de R$ 300 para R$ 350. Segundo ele, isso é importante para o setor porque aumenta o poder de compra da população mais pobre, estimulando o aumento do consumo “formiguinha”. “Esse consumo responde por algo como 80% do total de cimento consumido no país”, diz.
Carlos Sampaio, presidente da Quartzolit, conta que o que sustenta as vendas de argamassa é realmente o consumo “formiga”, pois os investimentos ainda estão tímidos. “Só agora os financiamentos começaram a ser liberados e utilizados pelo consumidor”. Com novas linhas de financiamento e a preocupação do governo em investir em obras públicas, o diretor acredita que o volume de vendas da Quartzolit deve crescer 10%, resultado maior do que os 6% de 2005.
Bráulio Borges, economista da LCA Consultores, projeta um crescimento de 7% da formação bruta de capital fixo. Desse total, 2 pontos percentuais virão da aceleração do investimento público federal. Só no começo de ano o governo gastou R$ 11 bilhões, que foram restos a pagar de valores autorizados bem no final do ano passado para obras que só começaram em 2006.
O investimento privado também deve se recuperar bem esse ano. A expectativa de Borges é de que no final de março a taxa de juros de longo prazo (TJLP ) caia dos atuais 9% para 8,5%. “Com isso, os juros reais para investimento ficariam em torno de 4%, uma taxa bem próxima a que empresas estrangeiras encontram em países desenvolvidos para financiar projetos”, diz. O reajuste do salário mínimo, por sua vez, impulsionará a construção dos chamados “puxadinhos”.
O diretor-executivo da Abramat, entidade que representa os fabricantes de material de construção, Roberto Zullino, disse que as medidas tomadas pelo governo no ano passado e no começo deste, como o patrimônio de afetação (que reduz o imposto a pagar nos empreendimentos a 7% das vendas) e a redução do IPI, podem fazer com que as construtoras se interessem pelo segmento voltado à classe média.
Segundo Zullino, as construtoras representam apenas 16% do mercado de moradias porque abandonaram os segmentos mais populares e se concentraram nos imóveis de luxo. A maioria das vendas de material de construção ainda é feita diretamente para os proprietários das casas que estão sendo construídas ou reformadas.