Auditoria é imprescindível à transparência nos negócios
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A Polícia Federal desencadeou em maio a operação Navalha, que desarticulou uma organização criminosa que atuava desviando recursos públicos federais. Mais de 40 envolvidos em fraudes e corrupção foram identificados, compondo três níveis. O primeiro era formado pelas pessoas ligadas à construtora Gautama da Bahia, o segundo por auxiliares e intermediários no pagamento de propinas e, no terceiro, apareciam autoridades públicas que, na estrutura da quadrilha, possuíam o papel de remover obstáculos à atuação delituosa do grupo. Entre os métodos utilizados pela quadrilha estava o custeio de viagens de autoridades estaduais a Brasília para defender os interesses criminosos do grupo. O esquema era estruturado de maneira a garantir a atuação criminosa, independentemente do poder político local.
No final do mês, em Manaus, em outra operação, chamada Hiena, a PF prendeu servidores públicos da Receita Federal e empresários acusados por envolvimento em esquema criminoso especializado na prestação de serviços de consultoria e direcionamento de fiscalização. Através de um escritório de advocacia de fachada, os acusados buscavam a sonegação de impostos, lesando a Fazenda Pública.
Órgãos públicos e empresas privadas dispõem de ferramentas para fiscalizar e evitar que casos como esses ocorram, através das auditorias e controladorias. “A essência do problema, do ponto de vista administrativo é que os controles, se existiam, falharam. A falha não foi por ausência de regra escrita, mas por falta de estrutura formalmente constituída ou por concepção mal formulada na sua implementação”, diz o agente fiscal da Controladoria e Auditoria-Geral do Estado, José Sílvio Born.
A legislação brasileira prevê cuidados indispensáveis ao trato da atividade pública. O artigo 70 da Constituição Federal estabelece que a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder. Born lembra que também a Lei nº 4.320 de 17 de março de 1964, em seu artigo 64 define: a ordem de pagamento é o despacho feito por autoridade competente, determinando que a despesa seja paga.
“Se forem observadas as atividades dos indiciados pela PF não se encontrará nenhum deles pertencendo aos serviços de contabilidade ou de auditoria. Por que razões não estariam ali apontados?”, questiona Born. O agente fiscal levanta duas hipóteses: em primeiro lugar por que não fariam parte do esquema e, em segundo, por não existir um órgão de controle interno que possua autonomia funcional para evitar que se elaborem os contratos sem a adequada licitação, nem se façam os pagamentos sem a comprovação da realização das obras.
Profissional deve atuar junto à gestão das empresas Nas empresas privadas, o papel do auditor deixou de ser o de mero fiscalizador e passou ao de oferecer suporte para a gestão estratégica das empresas, na avaliação dos controles de processos, avaliando melhorias e propondo mudanças. O diretor de auditoria da Brasil Telecom, João Carlos Orzzi Lucas, diz que a recomendação é que as auditorias tenham total independência em relação à direção das corporações. “Ela deve ter liberdade para transitar, percorrer a empresa e alertar que os objetivos estipulados não estão sendo seguidos, quer seja uma S.A. ou uma Ltda.” Ele diz que o número elevado de casos de corrupção descobertos pela Polícia Federal deve-se a controles mais eficientes. “Os processos e as gestões estão cada vez mais aprimorados. Com isso, Polícia Federal e Receita Federal trabalham com mais informações a partir destes controles.”
O auditor precisa ter pleno conhecimento dos riscos estratégicos envolvidos na atividade da empresa, como financeiros, operação. Imagem, mercado, ambientais, operacionais e outros. “Ele deve perceber quando um desses riscos ameaça a empresa e propor medidas que sejam evitados. Nos grandes escândalos, sempre vemos um auditor fuçando, ele é um guardião da ética,” afirma Lucas. Nos últimos anos, as empresas perceberam que atuar na gestão de perdas traz melhorias. “É fundamental para a saúde e perenidade dos negócios. Por trás de um gestor de sucesso, encontramos um auditor trabalhando para que não ocorram erros.”
Na montadora de carros Peugeot, ações propostas pelo setor de Controle Interno no Brasil possibilitaram ganhos à empresa. “O desenvolvimento de processos como locação de veículos, feita apenas no País, proporcionou uma visibilidade maior ao produto”, diz o gerente de Controles Internos José Bernardes. Antes chamados de homens de preto ou dedos-duros, os auditores hoje não são mais tidos como os caçadores de pessoas, e sim de processos equivocados. “O auditor não faz uma especulação sobre a vida pessoal ou profissional do funcionário e sim dos processos empregados nas suas tarefas desenvolvidas diariamente, na busca de erros que prejudiquem seu desenvolvimento”, destaca Bernardes.
Escândalos ressaltaram a importância do auditor O trabalho de uma auditoria pode ser feito de duas formas dentro de uma empresa ou instituição. “Pode ser tanto interna, realizada por funcionários da corporação, ou externa, por meio de um servido contratado. Entretanto, as duas estão ligadas à contabilidade, uma vez que apenas contadores podem desempenhar a função”, explica o sócio da PricewaterhouseCoopers Gilberto Bagaiolo.
A auditoria interna atende às necessidades da administração, como metas e objetivos. Já a externa responde a órgãos reguladores, credores, governo e os públicos interno e administrativo. Enquanto a primeira está focada nos controles internos, ligada à alta administração da empresa e é um processo contínuo, o segundo tipo de auditoria é independente, contratada em determinadas situações para apurar possíveis fraudes. “A auditoria interna vai à miúde em todas as áreas. A externa opina sobre as demonstrações como um todo”, diz Bagaiolo. Quanto maior o nível de governança corporativa uma empresa tiver, menor a possibilidade de deficiência de controle interno.
Órgãos de governo fiscalizam ações dos poderes públicos Nos governos federal, estadual e municipal, diferentes órgãos encarregam-se de fiscalizar o exercício das funções e verificar possíveis desvios. A União possui dois órgãos que executam a tarefa, a Controladoria-Geral da União (CGU) e a Coordenação-Geral de Contabilidade. A CGU atua como órgão central de controle interno e a Coordenação-Geral de Contabilidade, vinculada à Secretaria do Tesouro Nacional, trata de Normas Gerais e da Consolidação das Contas e de outras atividades. O secretário federal de Controle Interno da CGU, Valdir Agapito, diz que o órgão atua na fiscalização dos recursos federais e acompanhamento do plano de governo e execução de suas ações. “Fazemos o controle de resultados e controle preventivo, avaliando a legalidade de atos de gestão da presidência e ministérios”, afirma. Agapito explica que a atividade da CGU é orientada conforme a prioridade do governo, em função do que é encaminhado ao Congresso Nacional ou projetos como o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e outras metas sociais.
Alguns programas são executados em pareceria com estados, municípios e entidades civis. Nestes casos, a CGU também fiscaliza a realização da proposta dos projetos e possíveis desvios. Nos últimos anos, a Controladoria recebeu outras atribuições. Foi criado o Portal da Transparência, que disponibiliza todos os gastos do governo e transferências feitas a municípios e estados. “Por conta da transparência que a Controladoria obtém com o portal, o Bolsa Família, por exemplo, já recebeu pedidos de descredenciamentos de beneficiados que viram seu nome incluído nele”, diz Agapito.
Se um servidor público cometer um desvio de conduta, a CGU inicia processo administrativo, mais ágil do que os judiciais. Outra medida que o órgão pretende combater, através de aprovação de projeto de lei, é a atuação dos chamados servidores anfíbios, que atuam tanto no serviço público quanto em empresas privadas. Agapito diz que o número de atuações realizadas a partir das operações da Polícia Federal deve-se a um trabalho mais eficaz e em parceria dos órgãos de defesa do Estado. “Muitas vezes, só a auditoria era insuficiente. O que mudou foi a forma inteligente e conjunta de trabalhar, possibilitando o desmembramento de mais casos de corrupção”, destaca.
O controle exercido nos estados foi alterado nos últimos anos, com um agente fiscal em cada unidade da federação. “O fiscal visita as obras, faz as verificações, confere se o material recebido foi utilizado. Isso facilita o controle por parte do governo e da população.”
No Estado, a fiscalização é realizada pela Controladoria e Auditoria-Geral do Estado (Cage). Conforme o auditor da Cage, Roberval da Silveira Marques, o controle é uma das peças fundamentais para o Estado garantir que não ocorram casos de corrupção. A Cage realiza auditorias periódicas nas fundações e autarquias gaúchas, emitindo comunicados e relatórios com a situação dos órgãos. “A maior parte dos pontos equivocados detectados é em função de atropelos e desconhecimentos de normas.”
O auditor lamenta o quadro de servidores reduzido da Cage atualmente, que impede a atuação junto às grandes estatais, como Banrisul, Corsan e CEEE. A Cage foi criada em 1948 e, ao contrário de alguns estados, que possuem em seus quadros trabalhadores em cargo de confiança, só utiliza-se de servidores concursados para o exercício das funções.
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