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A incidência da Cide na importação de direitos de software

Publicado em:

Valor Online

Luiz Eduardo M. Lucas de Lima e Ricardo M. Gaertner

Há alguns anos o mercado brasileiro de software acompanha, com preocupação e grande expectativa, as notícias, decisões e atos regulatórios envolvendo a incidência da Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) sobre operações internacionais envolvendo softwares. Recentemente, com a edição da Lei nº 11.452, de 27 de fevereiro de 2007, ficou expressamente excluída da incidência da Cide-Tecnologia, a partir de 1º de janeiro de 2006, a importação de direitos de uso ou de direitos de comercialização ou distribuição de programas de computador, salvo quando envolverem a transferência da correspondente tecnologia.

A despeito desta expressa previsão legal de não incidência da Cide-Tecnologia, fato é que, para muitas destas operações internacionais com softwares, a Cide-Tecnologia nunca incidiu, mais especificamente sobre a importação de direitos de sub-licenciar (comercializar e distribuir) programas de computador diretamente de seu autor.
A Cide-Tecnologia foi criada pela Lei nº 10.168, de 29 de dezembro de 2000, segundo a qual a contribuição era devida pela pessoa jurídica detentora de licença de uso ou adquirente de conhecimentos tecnológicos, bem como aquela signatária de contratos que impliquem transferência de tecnologia, firmados com residentes ou domiciliados no exterior. Portanto, segundo a redação original da Lei nº 10.168, eram três os núcleos de incidência da Cide-Tecnologia – e nenhum deles se aplicava ao caso de importação de direitos de sub-licenciar softwares, porquanto nesta operação não há aquisição de licença de uso de programas de computador, não há aquisição de conhecimentos tecnológicos e nem, tampouco, transferência de tecnologia.
Pela Lei nº 10.332, de 19 de dezembro de 2001, a Cide-Tecnologia passou a ser devida, também, pelas pessoas jurídicas que creditarem ou remeterem programas de computador, a qualquer título, a beneficiários residentes ou domiciliados no exterior, constituindo esta operação em mais um dos núcleos de incidência da contribuição. Entretanto, a contraprestação pela importação de direitos de sub-licenciar programas de computador diretamente de seu autor não é caracterizada como royalty, pois sua definição, conferida pelo artigo 22 da Lei nº 4.506, de 30 de novembro de 1964, é o rendimento decorrente do uso, fruição e exploração de direitos autorais, salvo quando percebidos pelo próprio criador ou autor da obra.


O contribuinte tem boas chances de obter a recuperação judicial de valores recolhidos indevidamente


Assim, as operações de importação de direitos de sub-licenciar softwares, diretamente de seu autor, também não estavam sujeitas à incidência da Cide-Tecnologia, ainda que considerada a regra instituída pela Lei nº 10.332. Se as regras da Lei nº 10.168 e da Lei nº 10.332 não eram expressas quanto à não-incidência da Cide-Tecnologia sobre a importação de direito de comercialização ou distribuição de programas de computador, sem transferência de tecnologia, mas, ao contrário, demandavam interpretação neste sentido, com a edição da Lei nº 11.452 esta incidência ficou expressamente excluída. Desta forma, após 1º de janeiro de 2006 não há dúvidas de que a Cide-Tecnologia não incide na importação de direito de comercialização ou distribuição de softwares, sem transferência de tecnologia, e valores eventualmente recolhidos a partir desta data poderão ser recuperados pelo contribuinte sem grandes dificuldades.
A despeito dos argumentos aqui expostos, antes de 1º de janeiro de 2006 dúvidas ainda persistem acerca da não-incidência da Cide-Tecnologia nos casos de importação de direito de comercialização ou distribuição de programa de computador, sem transferência de tecnologia, já que o Conselho de Contribuintes do Ministério da Fazenda, ao julgar o Processo Administrativo nº 19515.000030/2003-03, em 24 de janeiro de 2007 – cujo acórdão final ainda não foi publicado -, decidiu que a Lei nº 10.168 e a Lei nº 10.332 determinavam a incidência deste tributo nas operações aqui tratadas.
No que diz respeito às decisões judiciais atinentes à matéria publicadas na imprensa especializada, destacamos que os argumentos aqui expostos não foram devidamente apreciados pelos tribunais pátrios, razão pela qual ainda acreditamos que o contribuinte tem boas chances de obter a recuperação judicial de valores indevidamente recolhidos a este título. Trata-se de uma questão que ainda vai gerar muita discussão, principalmente na esfera judicial, tendo em vista que a referida Lei nº 11.452 é explícita quanto à não-incidência da Cide-Tecnologia sobre as operações aqui tratadas apenas a partir de 1º de janeiro de 2006, ao passo que, no período anterior, há bons argumentos para sustentar que a Lei nº 10.168 e a Lei nº 10.332 não determinavam a incidência deste tributo nas operações de importação de direitos de sub-licenciar programas de computador, adquiridos diretamente de seu autor.
Luiz Eduardo Monteiro Lucas de Lima e Ricardo Menin Gaertner são advogados e sócios do escritório Lucas de Lima, Medeiros e Menin Advogados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso dessas informações


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