Fornecedoras de painéis fotovoltaicos disputam mercados residencial e comercial para geração distribuída de eletricidade
Até o fim do ano, a Brasil Solair inaugura em João Pessoa (PB) a primeira fábrica brasileira de painéis fotovoltaicos para geração de energia elétrica. A empresa acredita que, com o projeto, fruto de um investimento de R$ 20 milhões, garante vantagem sobre seus competidores em um mercado que dá os primeiros passos no Brasil: a microgeração de eletricidade. Mercado que trouxe ao Brasil tecnologia da italiana Enel Green Power, pelas mãos da Endesa, e que já gera negócios para uma série de pequenas empresas e economia para consumidores de energia pelo país.
Regulamentada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) em 2012, a microgeração permite que o consumidor seja tenha equipamentos para gerar energia – solar, eólica ou a biomassa – em casa ou em seu estabelecimento comercial e venda eletricidade para a distribuidora local, garantindo descontos na conta de luz. Muito difundido na Europa, o modelo engatinha no Brasil, mas segundo estimativas da Plano Decenal de Energia, elaborado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE) tem potencial para gerar até 1,9 mil gigawatts-hora (GWh) em 2022 – hoje, são apenas 14 GWh.
Além dos benefícios ao consumidor, a geração distribuída de energia reduz a necessidade de investimentos em grandes projetos energéticos. "É uma tendência mundial e é certo que o Brasil entre nessa rota", diz o professor Nivalde de Castro, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia da UFRJ (Gesel). Antecipando-se a esse movimento, a Brasil Solair decidiu pelo investimento na fábrica de João Pessoa, que terá capacidade para fabricar até 300 mil painéis por ano.
A Endesa criou a Prátil, que oferece soluções semelhantes. "Não queremos ficar de fora. Temos toda experiência do grupo no exterior e usamos esse conhecimento aqui no Brasil", diz o presidente da companhia, Albino Mota. A primeira instalação da empresa foi feita na embaixada italiana em Brasília, em 2010. Com a regulamentação da microgeração, Mota aposta em novas oportunidades. "Acreditamos que em dois ou três anos haverá um crescimento muito grande desse mercado no Brasil, com a entrada de cada vez mais empresas", adianta.
De fato, relatório da Associação da Indústria Fotovoltaica Europeia diz que a Europa, maior gerador mundial de energia solar, está chegando ao nível de saturação, o que deve levar os fornecedores a buscar novos mercados. "A redução do mercado na Europa não será compensada imediatamente pelo crescimento de outras regiões no mundo. Novos mercados terão que ser abertos para garantir o desenvolvimento do setor em níveis vistos na Europa até agora", diz o documento, que aponta economias asiáticas e americanas como potenciais clientes.
O alto custo de instalação, que não sai por menos de R$ 14 mil, é visto por especialistas como um obstáculo ao crescimento do mercado. "É como se fosse a compra da energia antecipada. Você está comprando energia por 25 anos, tempo de garantia dos painéis solares, e vai ter retorno do investimento inicial que fez", diz Mota, da Prátil. Segundo ele, o desconto na conta de luz pode chegar a 85%. O setor defende linhas de financiamento mais atrativas para que novos clientes sejam atraídos.
driblar a resistência do consumidor ao alto investimento inicial, a Brasil Solair aluga os painéis, cobrando sua parcela ao longo do contrato. "O brasileiro tem visão de curto prazo e não quer esperar para recuperar o investimento", diz Nelson Silveira, diretor-presidente da companhia. Nesse caso, a economia na conta de luz fica em torno dos 15%, uma vez que o cliente tem que pagar o aluguel do equipamento. Com a fábrica brasileira, a empresa espera enquadrar o produto em linhas do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), com taxas mais baixas para produtos com índices mínimos de nacionalização.
A maior parte dos projetos em operação está hoje concentrada no Nordeste, onde está o maior potencial de geração solar do país. O microgerador de energia vende excedentes à rede durante o dia e consome da rede à noite. Ao final do mês, é feito um balanço para definir qual o montante a ser compensado pela distribuidora. Em parceria com a Caixa Econômica Federal, a Brasil Solair instalou painéis solares em um conjunto habitacional em Juazeiro (BA), com investimento de R$ 7 milhões bancados pelas duas parceiras. Os benefícios com a economia de energia nos próximos anos ficarão para a administração, diz Silveira.
Para Castro, da UFRJ, é pela microgeração que se dará o crescimento da geração solar no Brasil, que tem outras fontes de energia em grande escala. "Faz parte uma revolução tecnológica, que chamamos de smart grid (redes inteligentes)", comenta o especialista, lembrando que, para participar do mercado, o cliente precisa de medidores especiais e transformadores bidirecionais, que permitem a entrada e saída de energia do edifício. Silveira, da Brasil Solair, diz que há cidades em que as redes inteligentes definem automaticamente quem gera energia em determinadas horas do dia, para aproveitar os melhores preços.
Geração em grande escala ainda não é competitiva
Pela primeira vez na história dos leilões de energia no país, empreendedores apresentaram projetos de geração fotovoltaica para disputar contratos com distribuidoras de energia do país. Foram 108 empreendimentos, com potência de 2,7 mil megawatts (MW), para participar da concorrência, inscritos para o próximo leilão de energia de reserva, marcado para o dia 18. Especialistas, porém, veem pouca possibilidade de vitória dos projetos, que disputarão com centrais eólicas e usinas termelétricas a gás, biomassa e carvão.
"Em outros países, de matriz energética mais concentrada em não renováveis, as solares vêm ganhando espaço. Mas no Brasil, ainda não é competitiva com relação às fontes hidráulica e eólica", diz o professor Nivalde de Castro, do Grupo de Estudos do Setor Elétrico do Instituto de Economia da UFRJ. Segundo cálculo de analistas, o custo da energia solar no Brasil giraria hoje em torno dos R$ 200 por megawatt-hora (MWh) – projeções mais otimistas chegam ao limite de R$ 165 por MWh. O preço-teto estabelecido para o leilão é de R$ 126 por MWh.
Países como os Estados Unidos, Alemanha e Espanha têm avançado na construção de centrais solares, mesmo com níveis de incidência do sol bem menores do que no Brasil. Somente em 2012, a Alemanha instalou 7,6 mil MW em nova capacidade de geração solar. A fonte renovável foi responsável pelo suprimento de 8 milhões de residências alemãs no ano passado, segundo associação que representa os produtores locais.
"O potencial solar no Brasil é imenso, a questão é viabilidade econômica", reforça Castro, lembrando que a fonte eólica, que hoje se destaca nos leilões de energia de reserva, já passou por momento semelhante. "À medida em que a tecnologia amadurece, que criamos um parque industrial produtivo, a tendência é que a competitividade da fonte aumente", conclui.